Redação Só Notícias: A Câmara de Consumidor e Ordem Econômica do Ministério Público Federal (MPF) elaborou nota técnica em que destaca a relevância socioeconômica e os benefícios concorrenciais da construção da ferrovia EF-170, a chamada Ferrogrão, que pretende ligar o estado do Mato Grosso ao Pará. Segundo o documento, o projeto representa um avanço no desenvolvimento e integração da infraestrutura de transporte do país, com impacto direto na redução do custo de escoamento da produção agrícola brasileira. 

Além disso, o entendimento é de que a ferrovia contribui para ampliar a concorrência no setor, com possível diminuição nos preços do frete. O documento reforça a importância de uma matriz de transportes integrada e diversificada, especialmente num país de dimensão continental como o Brasil, em que longas distâncias separam os polos de produção agropecuária dos centros consumidores e dos canais de exportação. Ressalta ainda as vantagens da recuperação e expansão do modal ferroviário no país, “em razão das suas vantagens em relação ao custo do transporte de grande volume de cargas por maiores distâncias, além do menor consumo de combustível e à geração de menor nível de poluição, quando comparado ao modal rodoviário”.

A análise também destaca a relevância da Ferrogrão para o aumento da produtividade e competitividade dos produtos nacionais, em especial das commodities agrícolas, cujo principal centro produtor situa-se na região Centro- Oeste. O projeto “permitirá o escoamento [da produção] pelo modal ferroviário, mediante integração com o modal hidroviário, em direção ao centro exportador localizado na região Norte, mais próximo se comparado ao setor portuário da região Sudeste”, explica o documento.

Além do mais, a criação de novos corredores logísticos aumentará a concorrência tanto com o modal rodoviário, o mais utilizado no país, quanto com as malhas operadas pelas duas grandes empresas que atuam no setor ferroviário atualmente. Na avaliação do MPF, tal cenário tem impacto direto na redução do preço dos fretes, “gerando potenciais relevantes retornos socioeconômicos em termos de geração de emprego e renda”.

A nota técnica enfatiza, ainda, que o direcionamento do valor de outorga da concessão da Ferrogrão para investimentos no setor ferroviário é uma forma de assegurar recursos para a expansão e melhoria da matriz de transportes, “permitindo o financiamento dos investimentos com recursos advindos do próprio setor, em um contexto de limitação de recursos públicos”.

Segundo a assessoria, a nota técnica foi produzida pelo Grupo de Trabalho Transportes do MPF e tem como foco analisar o projeto do ponto de vista concorrencial e da ordem econômica. A análise foi enviada aos Ministérios da Infraestrutura e da Economia, à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e ao Tribunal de Contas da União (TCU), nesta quarta-feira.

Os processos para implantação da ferrovia estão paralisados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em ação movida pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). O relator é o ministro Alexandre de Moraes, que concedeu liminar, em março, a favor da suspensão do processo e de dispositivos da Lei nº 13.452/2017, oriunda da Medida Provisória (MP) nº 758/2016, sob o argumento de que a alteração de limites causaria danos ambientais e deve ser feita via projeto de lei e não por MP, de acordo com a tese defendida pelo partido. A decisão ainda será analisada pelo plenário do STF, com o voto dos demais ministros.

Recentemente, o procurador-geral da República, Augusto Aras, encaminhou ao Supremo uma manifestação pedindo a derrubada da decisão. Ao deferir a liminar,  o ministro entendeu que a exclusão de 862 hectares do Parque Nacional do Jamanxim, no Pará, para passagem da ferrovia, não poderia ter sido definida por meio de Medida Provisória e demandaria a promulgação de “lei em sentido formal”.

No parecer encaminhado ao Supremo, Aras afirmou que não haverá “prejuízo ambiental relevante” com a redução de 0,054% na área do parque nacional. Para o procurador, a alteração territorial vai “permitir a construção de ferrovia destinada a escoar a produção agrícola e, com isso, facilitar o transporte e o abastecimento em diversas regiões do país, além da consequente redução na emissão de poluentes originados pela circulação de caminhões de transporte de cargas”. Por esse motivo, segundo ele, o projeto “não viola, mas, ao contrário, concretiza o princípio do desenvolvimento sustentável, uma vez que não se visualiza prejuízo ambiental relevante ocasionado pela pequena redução da área de proteção ambiental em relação ao desenvolvimento econômico proporcionado pela construção da ferrovia”.

Já o Instituto Sócio-Ambiental Floranativa contesta as alegações do procurador. A entidade afirmou que, ao contrário do alegado por Aras, a redução do parque não será pequena.  “A PGR repete diversas vezes o valor 0,054% como se isso desse a conotação de ser algo pequeno, de menor importância ambiental. Não é! O espaço de terra que está em discussão aqui é de 862 hectares, ou 8,62 km² – uma área gigantesca de Floresta Amazônica. São aproximadamente 1200 campos de futebol!”.

O instituto também rebateu o argumento de que haverá um retorno ao Parque Nacional das áreas não utilizadas pela Ferrogrão. “Ora, se uma MP não pode reduzir UC, ela certamente não pode deixar a decisão ao bel prazer do empreendedor. E, no frigir dos ovos, essa condicionante é inútil porque o traçado da Ferrogrão já é definitivo. Os estudos ambientais servem apenas para legitimá-lo, não para alterá-lo. Não haverá retorno à UC”, afirmou o ISAF.

Na manifestação, o ISAF ainda garantiu que não é contra a implantação da Ferrovia, mas, sim, contra a alteração do parque feita por meio de Medida Provisória. “Se a Ferrogrão será tão benéfica quanto se diz, certamente não há problemas em levar a questão ao palco público do processo legislativo ordinário, usando do meio adequado para alterar a UC. Após isso, que se promova o devido processo de licenciamento ambiental”.

Além de suspender a lei resultante da MP, Alexandre determinou a paralisação dos processos relacionados à Ferrogrão, em especial os em trâmite na Agência Nacional dos Transporte Terrestres (ANTT), no Ministério da Infraestrutura e no Tribunal de Contas da União (TCU). Ainda não há data definida para a liminar ser analisada pelo plenário do STF.

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